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MEU MUITO DE ÚRSULA IGUARÁN

É sempre arriscado se expor nessa altura da minha vida. Ainda por cima quando ainda é forte o efeito do prazer da novidade. Assumo que no último ano vivi de maneira precária. Até mesmo suspeitei que não teria mais forças para aguentar a destruição de minhas esperanças. No entanto, estou saboreando um encantamento cheio de significação pessoal.
Antes de você, estive agoniado. Imaginei que a minha vida tivesse terminado. Realmente desejei que ela tivesse terminado. Esqueci que nada que se perde é para sempre no mundo dos homens. Tornei nauseante a certeza de que o sofrimento é temporário. Repeti mantras fugazes com tanta regularidade que eles acabaram se tornando um tumulto de sons tortuosos, esvaziados de significado, que não indicavam o desaparecimento de nenhuma realidade fúnebre. Achei que a decepção havia bebido todas as lágrimas de meus olhos, mas você revelou que eles ainda estavam cheios de água.
Meu muito de Úrsula Iguarán, quando comecei a lhe responder estava só de brincadeira. De repente, em meio ao caos da excitação, me senti vivo. Aprendi novamente a fazer as coisas se tornarem reais. Não calculei que o amor não se conjuga e não se afoba. Achei que era só poesia a crença de que os futuros amantes se amarão sem saber. Em nenhuma circunstância imaginei que o amor comia os papéis já escritos de nossas vidas. Sempre achei que os meus diários de menino disforme eram intocáveis, mas, você, irrefletidamente, fizera-me demoli-los.
Ainda que a minha existência seja a comum vida de um mortal insignificante, sempre serei diferente de todo mundo. A minha complexa personalidade não é a de homem que deixa o seu corpo abandonar-se no vazio. Parece-me que pertenço a qualquer outra espécie. Entre tantos milhões de divórcios, o meu também terminou mal. Penosamente, descobri traições e nem sempre suportei a tortura do vazio deixado pelos doze anos que somaram tantos projetos irrealizados de vida. Por mais dissimulada que a vida em comum com Eunice tivesse ficado, a natureza de suas traições era muito pior que a crueza de imaginar seus orgasmos. Mais do que tudo isso, nos dois meses posteriores percebi que quando o sofrimento atinge certo patamar, a gente tenta qualquer coisa para explicar o que está acontecendo, mesmo sabendo que a maioria das explicações são fúteis. Por quase um ano não consegui compreender aquele meu pesadelo universal. Escolhi parir uma imitação de mim. Cercado por mulheres, submerso na bebida e berrando pouco à Mãe De Deus entrei em pânico. Questionava todos os dias os motivos de minha angústia. Abominei a minha existência. Padeci com a sensação de sufocamento. Havia cansado de ser o homem que sempre toca o sofrimento para frente. Por quase três décadas, as perdas me abalavam, mas poucas enfraqueceram o meu desempenho. Por meses só consegui desempenhar papéis cênicos. Fui o homem que estava louco interpretando um paciente restabelecido, o homem arrasado interpretando o homem estável, o homem descontrolado interpretando o homem controlado, o homem absorvido em seu egoísmo interpretando o filho de Santa Teresa D’Ávila. Desafio qualquer um a desempenhar esses papéis sem ficar deformado pelo esforço. A minha deformação me fez interpretar até o papel de um homem que queria morrer.
Não lhe pedi e você já me ajudava a suportar toda essa situação, desde o tempo em que só ouvia sobre o mal quase irreversível que experienciei. Não lhe pedi, mas na tua audição leio as linhas tortas de minha vida. Nunca quis te procurar, mas quando te conheci corri ao teu encontro, e, desde então, sorrimos, falamos e marcamos os nossos dias com palavras líquidas, deleitosas, ásperas, obscenas. Estamos caminhando juntos pela vida. Estamos com as nossas almas repousadas na nossa cama. Entre os nossos prazeres percebo que não amo de mais a mim e que amar você é ter a certeza na onipotência do amor. É também ter a certeza de que os mortais são tolos por não terem apanhado o teu coração.
Há menos de um ano você não existia em meu mundo. Talvez por isso ele sempre tenha sido incompleto. Há um ano eu era o marido de Eunice, enquanto você agoniava os teus dias. Há meses você respondia os meus stories em busca de alguma interação. Hoje sou eu quem busca no teu sorriso a minha interação com a verdade. Há meses a tua carinha de sono me fascinou. Hoje ela é o meu amanhecer. Há meses comentei que no fundo eu não passava de um existencialista católico. Hoje rezamos juntos todas as noites. Há anos eu havia perdido a esperança de realizar o meu sonho de menino. Hoje sou pai. Há meses o seu picolé mascado tornou-se adubo à minha fidelidade. Tal como a morte, o amor é uma experiência abrupta que se impõe. Não é calculado. Ele acontece. Ele nos toma, nos compreende, nos radicaliza. Tal como a morte, o verdadeiro amor é sempre uma experiência definitiva, que, uma vez iniciada, se crava. No seu calor indulgente, não há simples momentos, alegrias passageiras, prazeres transitórios.
Obrigado por dar-me o seu amor, meu muito de Úrsula Iguarán. Ele comeu até os dias que ainda não me foram anunciados. Devorou os minutos que ainda não vivi e os que talvez nem me restem. Amo-te com desejo e virtude. Como um bicho lotado de desejos. Como amigo em Cristo e como um amante insaciável. Você é a minha paz e a minha guerra. O meu dia e a minha noite. O meu silêncio e a minha confidência.
T.
Mister Thomas, estou zonzo com esse texto que de tanto tocar feridas que tenho em mim, deixou-me zonzo. Parabéns pelo texto e muita felicidade ao casal. Conheci seu site agora e já vi que tem muito o que me ensinar.
Obrigado, meu irmão. Simplesmente obrigado.
Meu Deus, que maravilha!!! Preencheu minha madrugada!!!
Que textão lindo, esse sentimento é devastador, sabemos que passará, só não sabemos quando!!